sexta-feira, 19 abril 2024

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Governo empurra e protela solução sobre Minha Casa Minha Vida para famílias carentes e mais afetadas pela crise

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Em uma das ações para enfrentar os efeitos da pandemia do coronavírus, a Caixa Econômica Federal anunciou, em maio, um prazo de 120 dias para mutuários pausarem o pagamento de financiamentos habitacionais. No entanto, este benefício não foi concedido às famílias integrantes da Faixa 1 do Programa Minha Casa Minha Vida, potencialmente as mais afetadas pela crise.

“Esta é a população de baixa renda que mais sofre com a pandemia”, observa o presidente da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa (Fenae), Sérgio Takemoto. “Muitos tiveram que interromper o trabalho e mal têm condições de se manterem. Provavelmente, são também os brasileiros que mais dependem do auxílio emergencial (de R$ 600) para levarem comida para casa e ainda correm o risco de ficar sem moradia. É um absurdo o governo tratá-los dessa maneira”, acrescenta.

A União Nacional por Moradia Popular (UNPM) reivindica, há mais de três meses, a suspensão do pagamento das parcelas do financiamento do programa Minha Casa Minha Vida (MCMV) para a Faixa 1, que atende às famílias mais carentes, com renda até R$ 1.800. Mas, o governo não se posicionou e não responde às solicitações do movimento.

A representante da UNMP, Evaniza Rodrigues, afirma que, desde fevereiro, a entidade busca solução junto à Caixa e ao Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR). Para Rodrigues, a Caixa disse que a decisão de pausar o financiamento depende do MDR.

A UNMP procurou o ministério, mas foi informada sobre a necessidade de uma portaria entre MDR e Ministério da Economia. “O movimento enviou um ofício ao ministério; porém, não tivemos resposta”, conta Evaniza Rodrigues.

EMPURRA EMPURRA — A Fenae também procurou informações junto à Caixa e ao Ministério do Desenvolvimento Regional para confirmar a exclusão da Faixa 1 e saber por que não é permitido a estes beneficiários a postergação do pagamento das prestações. A assessoria do banco respondeu que o financiamento da Faixa 1 não pode ser pausado e que a questão deveria ser tratada com o MDR, gestor do programa. A Fenae questionou o ministério sobre o motivo de não incluir estes beneficiários na pausa dos pagamentos, mas também não obteve retorno.

MEDO — Diante da dificuldade em pagar as parcelas, famílias têm medo de perder a moradia. Além de não conseguirem manter os pagamentos, o tempo de permanência em casa — por conta das medidas de isolamento social — refletiu no aumento dos gastos com despesas como água, gás e energia. “A vida ficou mais cara na pandemia para quem mais necessita de renda”, ressalta Evaniza Rodrigues, da União Nacional por Moradia Popular. “A parte do beneficiário que deveria ser paga no financiamento (varia de R$ 80 a R$ 270) poderia ser utilizada para estas despesas familiares”, pontua.

DESESPERO — É o caso da vendedora autônoma Rivonia Rosa, 46 anos. Hipertensa — ou seja, do grupo de maior risco ao coronavírus — ela perdeu o emprego um mês antes de assinar o contrato de financiamento da quitinete, pelo Minha Casa Minha Vida, no Condomínio Dandara, em São Paulo (SP). Com a pandemia, Rivonia ficou totalmente sem renda. Apesar dos riscos à saúde, ela precisou retomar a venda de roupas para conseguir sobreviver.

“Tem mais de um mês que não sei o que é descanso”, conta Rivonia ao jornal O Estado de São Paulo que, nesta sexta-feira (3), publicou a reportagem “Caixa cobra pagamento de prestações do Minha Casa Minha Vida a beneficiários de baixa renda”. Com três prestações do financiamento atrasadas — além de duas contas de gás e uma de energia também não pagas — Rivonia telefonou à Caixa Econômica para tentar pausar o pagamento das prestações. Após diversas tentativas, ela ouviu do banco que não havia suspensão da prestação para a Faixa 1 do programa.

Amigas da vendedora foram a agências da Caixa, com o mesmo objetivo, e também não conseguiram pausar a cobrança. “Sabe uma pessoa que ficou em desespero”, desabafou Rivonia à reportagem.

Conforme destacou Sérgio Takemoto ao jornal Estado de São Paulo, depois de um mês de inadimplência, os mutuários podem perder o imóvel. “É um risco muito grande que estas pessoas estão correndo”, lamentou o presidente da Fenae.

Ao jornal, a Caixa disse que “atua na qualidade de gestor operacional” [do Minha Casa Minha Vida] e que “cumpre determinações do gestor do programa, o Ministério do Desenvolvimento Regional”. O MDR informou à reportagem que “oficiou o Ministério da Economia, solicitando que fossem tomadas medidas orçamentárias que possibilitassem a suspensão das cobranças da Faixa 1”.

SEM RENDA — Na avaliação de Sérgio Lisboa, economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), a situação é ainda pior. “As pessoas não podem utilizar este valor porque, provavelmente, não têm esta quantia. Elas estão sem renda”, diz.

Lisboa cita uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísitca (IBGE), divulgada na última semana, sobre dados mensais da Pnad-Covid19. O levantamento mostra que 9,7 milhões de trabalhadores ficaram sem remuneração em maio de 2020, o que representa mais da metade (51,3%) das pessoas que estavam afastadas do trabalho e 11,7% da população ocupada do país, estimada em 84,4 milhões de trabalhadores.

DECISÕES NA JUSTIÇA — Em São Paulo, a Justiça Federal atendeu a uma ação do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e suspendeu, por três meses, a cobrança das parcelas dos integrantes da Faixa 1.

No Ceará, uma liminar também interrompeu a obrigatoriedade do pagamento por seis meses, com efeito retroativo a partir de fevereiro, em todo o estado. A paralisação foi apenas para famílias com renda mensal até R$ 4.650.

PROJETOS NO LEGISLATIVO — No Congresso, tramitam projetos de lei para suspender o pagamento enquanto durar o estado de calamidade pública. No Senado, foi apresentado o PL 2575/2020, de autoria do senador Rogério Carvalho (PT/SE). Outra proposição — o PL 1.935/2020, da senadora Rose de Freitas (Podemos-ES) — suspende as prestações de financiamentos habitacionais de consumidores afetados pela pandemia. O projeto aguarda designação de relator para começar a tramitar.

Na Câmara, outros projetos com teor semelhante foram apensados ao PL 795/2020, dos deputados Israel Batista (PV/DF) e Helder Salomão (PT/ES). O texto proíbe a cobrança de juros e moras sobre as parcelas suspensas. Este projeto estava previsto para ser votado na última quarta-feira (1º), o que não se confirmou.

Na opinião de Evaniza Rodrigues, da UNMP, o PL da Câmara dos Deputados atende às expectativas das famílias. “Pela conta do movimento, a aprovação do projeto vai beneficiar 1 milhão e quatrocentas famílias, que são as pessoas que já receberam moradia do Minha Casa Minha Vida Faixa 1 desde 2010, quando começaram as primeiras entregas”, analisa. Se aprovado, o PL seguirá à sanção presidencial.

REDUÇÃO DE JUROS TRAVADA — Há mais de seis meses, o governo anunciou uma reformulação do Programa Minha Casa Minha Vida. Entre outras medidas, o desejo do presidente Bolsonaro é rebatizar o nome do programa, criado durante o governo Lula, em 2009.

No entanto, nenhuma mudança efetiva foi definida. A crise da pandemia e um impasse entre ministérios travaram as negociações.

De um lado, o Ministério do Desenvolvimento Regional pretende reduzir os juros em 0,5 ponto percentual para as faixas 1,5, (a taxa atual é de 5% ao ano) e 2 (a taxa atual é de 5,5% a 7% ao ano) — com parte do valor subsidiado com recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

Do outro lado, o Ministério da Economia diz que não é possível realizar o corte, pois o caixa do FGTS está sobrecarregado. A liberação dos saques no FGTS afeta a fonte de recursos do programa e também prejudica o setor da construção civil, que enfrenta atrasos nos repasses para o setor habitacional.

O PROGRAMA — O Minha Casa Minha Vida foi criado em 2009 para facilitar o acesso à moradia e a compra da casa própria por famílias com renda até R$ 9 mil mensais, segundo a tabela de renda disponível no site do MDR. Ele é dividido em quatro faixas de renda, que definem as condições de financiamento, a origem dos subsídios e o valor das parcelas.

Os integrantes da Faixa 1 são aqueles com menor renda familiar: até R$ 1.800. Um percentual de 90% do valor é pago pelo governo, com recursos do Tesouro Nacional. Os outros 10% são pagos pela família, em até 120 meses, com prestações que variam entre R$ 80 e R$ 270, de acordo com a renda bruta familiar.

Exatamente estes beneficiários não podem suspender o pagamento das parcelas, como foi permitido para faixas mais altas. Foram contemplados os integrantes da Faixa 1,5 (famílias com renda até R$ 2.600), Faixa 2 (famílias com renda até R$ 4.000) e Faixa 3 (famílias com renda até R$ 7.000), financiadas com recursos do FGTS.

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